Largo de São Domingos. Casa. Uma memória
São Domingos Square. Home. Memory

Balde
António and Seidi
Anonymous
Angela
André Santos
Alex, Paulo and Flávia.
Alex, Paulo and Flávia

i.

remelexo no corpo todo
com telefone no ouvido
do banco próximo à igreja frente à pastelaria
dobra para próximo da árvore,
volta atravessar a praça
salto do sapato batendo arrastado,
bico fino
perna esticada
puxa
perna dobrada

 

ópera da boca do Paulo:
amigos para sempre
sempre vale a pena

 

andar arrastado.
Linha recta até banco 1º
estalido da bengala

 

ii. 

estalido das muletas
corta atravessando a lateral
pé enfaixado
para trás do corpo
sem tocar o chão
risadas. Soltas.
Quando em vez estalido mais discreto da Senhora
linha recta entrando na rua da ourivesaria
mais próxima ao centro
muleta de longe lateral do dona Maria

 

calças pretas cinzentas com bolas
degradé

 

bicicleta

 

venda da loto
confusão

iii. 

obras tiraram habitantes dos bancos virados para a ginjinha

 

sol bate neles às 3 horas da tarde
s. Jorge já está na sombra, os outros não.
Uma criança conhece o amigo do pai
Andou comigo na tropa
Homem comendo banana
Português vira crioulo que vira português

 

Bengala de madeira de braço dado com baixote
Parece que vai fazer uma lateral, diagonal curva

 

iv.

Lembro do bailarino do outro dia que se partia todo com violência
Em linha reta paralela à ginja:
barriga vai com a frente do corpo
bunda para a dentro
em linha diagonal a anterior:
homem com bengala para o alto
quase encosta o chão
desce
manobra no ar
troca de mão
passa rente à bolinha
corpo para trás
vai ficando e indo ao mesmo tempo
frente uma bolinha:
boné vermelho – 2 mãos no bolso, mão na cabeça
boné azul – uma mão no bolso e cotovelos para cima
rainha de branco com azul, manto roxo com veludos:
visita 1º banco
Volta
Mankarra
penso que diz uma lista de comidas
passeio de sacolas
esculturas de panos em torno do pescoço
roupas armadas com padrões coloridos
vem cá mister cunco

José Luis
Flávia and Mamadu Balde
Fátima
Edgar
Domingos Bifa
Djibi Embalo

v.

bengala estalando em 2 tempos
gritando a loto e os números do dia
olha o 13

 

pausas
Psit
olha pra trás
a abriiia iooo

a NNNo

aaa anamatula

a No aaaaqueloe

marramessemiii

AAA AA aa

êmequete

arra ta

 

seu abu em marcha
perna dura, perna esticada, corpo todo junto
bengala arrastando para um lado para o outro
diagonal até a chapelaria
duas bengalas silenciosas com pé enfaixado voltam
reta até a ginja
atravessa engraxate e some

vi.

2 bengalas para pegar medicamento para protecção
apoio nos cotovelos
mão na barriga

vii.  

estalido parecido com bengala
colar de metal
vestido verde limão à maneira
múltiplas direcções
ao longe o som do bandoleon
seu Jorge abana o corpo de um lado para o outro
duas mãos dentro da perna
bengala lenta
mão no bolso
saco de compras
plástico azul
atravessa praça para calçada
contínuo
pára
bengala para cima
vai
pára
murmura
olha para trás
eu gosto mais

 

cabrão queres ir para o chão

 

viii.

rei de bata branca parado à sombra
sacola em uma mão
outra mão à boca
vai e volta
da boca para o bolso
sacola de uma mão a outra


carinho com a ponta dos dedos
invasão das mulheres de preto e scarfes coloridas
cabelos escovados
muita maquiagem
cheiro a laquê
 
bengala carregada por cima
fluida
olhar sobre o ombro

Francisco and Jorge
Gil and Maira
Inácio, Bartolomeu, Madalena, Estevão and Pilar
Jorge and Paulo
Maria
Moreira

ix.

Paulo toma distância
Vai sozinho para a frente da esplanada
 
Bengala pequenina e rápida na paralela em frente à ginja


Je peut?
Mohamed, ça va?
J’était aux Porto


Bengala lenta
Bengala, passo, passo
Bengala, passo, meio passo
Sacola na outra mão
Daqui um pouco chega à frente dos bancos ou na porta da igreja

Sofia
Sanacidi
Sagdo Conraru
Paulo
Osvaldo and Cristina
Mustafa
Mumtaz

Nossos agradecimentos ao c.e.m. – centro em movimento e ao Festival Pedras D´Água. À Sofia Neuparth, Cristina Vilhena, Edgar Raposo, Infamara, Seu Abu, Jorge e Paulo, Dona Mimi, Sanhá, Aline, Carlos Paca, Dominic, Denise, Osvaldo, Genito, Cíntia, Juliana, Luís, Sirael, Sr. Mohammed, Taluma, aos nossos muitos amigos do Largo e àqueles que partilharam conosco suas histórias.

Largo de São Domingos is a sound installation and ethnographic performance created in 2008 by Carolina and Flávia. It was an invitation to listen to movement sounds and migration stories, done at the intersection of questions about migration, the city and performance. We started our research at c.em.- an artistic structure and our home by that time at Rua dos Fanqueiros. Inside our living room we heard immigrant’s life stories. After a few months, we started an exploration of Lisbon downtown streets. At São Domingos, routes were remade in echo of the newly lived moments. There they remained facing the memory of Portuguese past and present, the memories of the city, its colonial pains, its racism and its inequalities. There we could hear conversations from some and many other Portuguese, who made that place a passage, their Lisbon root, sheltered on the marble benches. We set out to be with people, to observe their choreography, their spatiality and invite those who pass by or are always there to sit on our red sofa as one day we were also invited to sit next to them.